segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Capítulo Cinco - Angelique

Capítulo Cinco - Angelique

Havia os dois lados em residir numa localidade como Monte Seco. Julian e os seus familiares não eram bem-vistos pelos demais moradores do lugar. Existia um distanciamento proposital de ambas as partes. O garoto e os demais de sua numerosa família preferiam o isolamento; moravam em uma grande fazenda, com muitos hectares de terra, cercados por um muro e muitos mistérios. De tempos em tempos, novas histórias eram criadas sobre acontecimentos que envolviam um ou mais dos habitantes dali. Algumas eram boatos reciclados de casos antigos; outros, possivelmente verdades. Julian estava mais do que habituado a tudo isso. Não mais se importava de chegar a lugares e ver algumas pessoas saindo às pressas ou cochichando a seu respeito. Por outro lado, quase sempre o que acontecia em Monte Seco não saía dali. Isso era bom. Na situação em que viviam Julian e a família, jamais poderiam fazer parte de um grande centro.
A responsabilidade de suprir a família com o que faltava não era sua, mas, assim mesmo, Julian doava uma parcela do seu tempo para ajudar no que fosse preciso. A avó, Agnes, o havia incumbido de ir até a cidade mais próxima a fim de comprar para ela o tecido necessário para um novo vestido para Angelique, sua prima.
Angelique era uma garota bonita. Moderna algumas vezes e rústica em outras. Nascera com a cor negra nos longos cabelos lisos, mas os tinha em tom avermelhado no momento. “Fiz luzes.”, disse ela quando surgiu altiva na fazenda, depois de ter ido à capital. Vestia-se com roupas simples, como as demais mulheres da família. Roupas feitas por elas mesmas; mas, algumas vezes, quando sentia vontade, retirava as mais atuais, mais da moda, que mantinha guardadas e desfilava para si mesma diante de um espelho. Suas atitudes quase sempre geravam um sentimento de desaprovação dos mais velhos e de inveja dos mais novos.
Julian sabia o que aconteceria naquela noite; não poderia evitar. Por isso, precisaria estar dentro dos muros antes do pôr-do-sol. Teria que ir bem cedo à loja que a avó indicara para comprar o tecido. Tinha a hora marcada para pegar o ônibus e já estava atrasado. Angelique entrou sorridente em seu quarto. Lugar simples, com uma cama, um guarda-roupa pequeno e uma mesinha na qual Julian guardava alguns pertences. Tinha uma pequena coleção de bonés americanos dos Yankees, que nunca usava. Ficavam ali guardados, sobre a mesa. No porta-retrato, uma foto sua com os pais falecidos. Em uma foto menor, estava Julian, com uns três anos de idade, usando o primeiro boné do time de beisebol de Nova Iorque, dado pelo pai.

- Sabe qual cor trazer; não sabe? – perguntou Angelique.

Julian continuou vestindo a roupa sem responder.

- Não precisa me ignorar. – continuou a garota, cruzando os braços – Sei muito bem aonde o senhor vai.

- Não sei do que você está falando. – respondeu Julian.

- Azul ou verde-esmeralda.

- Azul ou verde-esmeralda o quê, menina?

- Não! Já sei, melhor... Hum! Deixa me ver... Prateado.

Julian balançou a cabeça, calçando os sapatos.

- Vermelho, não. Apesar de gostar da cor, eu já tenho muitos vermelhos.

- Já lhe disse, Angel, não sei do que você está falando.

- Vai dar uma de desentendido? Eu sei que a vovó o mandou comprar um presente pra mim. E nós dois sabemos que ela só sabe lhe pedir pra comprar tecido pra fazer um vestido. Todo aniversário é assim.

- Então, se você já sabe, por que está me chateando?

- Porque o que você comprou anteriormente era um corte horrível.

- Só segui as orientações que me passaram.

- Por isso, eu vou com você hoje.

Julian olhou fixamente para a prima.

- Não. – enfatizou - Vou sozinho.

- Não faça assim, cabeção! – disse a garota – Esse pode ser o seu presente de aniversário pra mim.

- Eu lhe compro outro presente. Não estou a fim de mais encrenca com o seu pai.

- Ele nem vai ficar sabendo. – insistiu Angelique – A gente vai e volta logo. Ele nem vai perceber.

- Vou falar só mais uma vez. – falou mais sério, colocando a jaqueta preta - Vou sozinho e ponto final.

Angelique colocou as mãos na cintura, sorrindo. Ela já sabia o que realmente iria acontecer.

O retorno em silêncio de Melanie tinha duas finalidades. Primeiramente, para evitar ter de explicar à mãe a razão do aparente stand by sofrido ao perceber Julian abraçado a uma garota de cabelos vermelhos. E, em segundo lugar, ponderar que, de repente, estava sendo um pouco exagerada em relação a ele. Afinal, acabara de conhecê-lo. Não sabia quase nada a respeito dele. Então, como poderia sentir ciúmes numa situação como essa? Mas, infelizmente, era o que realmente sentia.

- Hum! Problemas no planeta Melanie? – perguntou, provocando, Flávia.

Melanie não queria comentar nada, mas certamente a mãe continuaria a provocá-la até ela se manifestar.

- Não, mãe. Minha vida é perfeita.

- Não sei se você sabe, mas eu a conheço bem melhor do que você mesma se conhece. Por isso, sei quando você não está bem de verdade e quando está só de onda.

Ela olhou para a mãe, confirmando que se sentia como se estivesse perdida no meio do oceano, sem farol para orientá-la.

- Não esqueça que já estive no seu lugar. – continuou Flávia.

- Ah, não, mãe! Não vai começar com o discurso do “quando eu tinha sua idade”.

– Não é discurso, Mel. É troca de experiências. Possivelmente, eu não passei pelo mesmo problema por que você está passando, mas tive, sim, problemas para resolver.

- Eu sei. Mas tem coisas que, talvez, eu precise passar sozinha.

- Sim, concordo. Mas, se você pode contar com alguém que se importa, ajuda bastante.

Só uma atitude Melanie poderia tomar, naquela hora: dar um sorriso de agradecimento à Flávia. Afinal, a mãe sempre se manteve firme ao seu lado em situações adversas. Sempre fora seu farol.

A caminhonete da família aguentou muitas e muitas viagens até as cidades aos arredores de Monte Seco. Agora, a velha F-100 de guerra não dava ares de suportar mais uma. Devido a isso, ir de ônibus era a solução para que Julian fosse buscar o que não tivesse em Monte Seco, ou seja, quase tudo.
Foi uma tarde agradável em companhia da prima, mas desde que Julian viu aquela garota da cidade grande, não conseguia mais parar de pensar em seus lindos cabelos, esvoaçados pelo vento e trazendo às suas apuradas narinas o cheiro suave que pairava sobre ela. Tinha os olhos cheios de vida e carregava junto dela algo que Julian não conseguia identificar. Apenas o que ela guardava dentro de si despertava um domínio sobre ele. Julian até desejou procurá-la novamente, mas as tarefas da fazenda estavam tomando muito de seu tempo. Viu-a duas vezes depois do primeiro encontro, mas sempre de longe. Como já sabia que ela estava residindo na pousada, teve receio de aproximar-se, e ela o rechaçar. Talvez a garota já soubesse de uma ou até mais histórias que contavam a respeito de sua família. Seria melhor ficar com a ilusão de que ela, ocasionalmente, também pensava nele.
Horas depois, estavam os dois voltando da cidade vizinha. A sensação de observar as paisagens, que passavam rapidamente pela janela do ônibus, fazia com que Julian, por alguns instantes, esquecesse os acontecimentos que sobreviriam à noite daquele mesmo dia. Cada casa que ele avistava à beira da estrada fazia com que pensasse na vida normal que ele jamais teria. Seria maravilhoso viver em um lugar como aquele, sem se preocupar em esconder seus segredos, sem a possibilidade de trazer perigo a alguém, mesmo que involuntariamente. Poder conhecer uma pessoa como Melanie e dedicar-se a ela, sem a remota chance de fazer-lhe mal...
Eram quase cinco horas da tarde. Julian e Angelique desceram do ônibus, retornando da cidade vizinha. Ela carregava, feliz, um embrulho envolvido em papel de presente. Eles precisavam se apressar para retornarem o quanto antes à fazenda. Algum tempo depois, cansados, os dois chegaram à casa principal. Marcus, pai de Angelique, esperava do lado de fora. A garota já conhecia muito bem as expressões paternas. Sabia quando ele não estava contente com alguma situação. Essa era a sua expressão no momento, encarando o sobrinho.

- Onde você foi? – perguntou Marcus à Angelique.

Marcus era irmão de Cassius, pai de Julian. O garoto tinha conhecimento de que era um homem impiedoso, mestre da traição. Considerava Julian, assim como a seu próprio irmão falecido, um obstáculo a ser ignorado. Não gostava da aproximação da filha com o filho do irmão.

- Só fui acompanhar o Julian.

- Ele não sabe se virar sozinho?

- Claro que sim, pai. Mas, de vez em quando, eu gosto de sair desta cidade. Ver coisas novas.

- Da próxima vez, eu levo você para ver essas coisa novas, ou o Elias a leva.

Elias era o filho mais velho de Aurélio, braço direito de Marcus. E tinha a mesma idade de Julian.

- Não se preocupe. – disse Julian – Na próxima vez, eu vou sozinho.

- Será melhor para você mesmo, se cumprir o que está dizendo. Caso contrário...

Julian considerou melhor não revidar a provocação do tio. Estava cansado pela viagem, e a discussão não levaria a lugar algum, mesmo porque Marcus sempre encontrava um modo de provocá-lo. Nenhum dos três precisou falar mais nada, enquanto Julian e Angelique entravam na casa principal. Todos já sabiam, e muito bem, o que cada um pensava.
Quando Julian retornara à fazenda, no dia em que conhecera Melanie, Marcus sentiu o cheiro da garota no sobrinho e reconheceu, imediatamente, que ela trazia algo diferente, perigoso, que precisava ser combatido. Algo que, com certeza, Julian não percebera. E, naquela noite, era hora de pôr isso à prova.

7 comentários:

  1. ta ficando muuuito legal .
    Eu to doida pra lê o resto *-----------*

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  2. Nossa parabéns tá ficando muitooO bom
    Espero que venha logo o resto
    Estou loka pra saber o que vai acontecer

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  3. Tá muito legal!
    Não vejo a hora de ler os próximos capítulos..
    Parabéns pelo blog!!

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  4. Eu tô começando a ficar doidaa!! oO'

    (ou, no mínimo, cismada!!)

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  5. algo perigoso para quem?
    Melanie ou eles?
    hehehehe
    tah ficando bom

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  6. Eu acho que é mais perigoso para Melanie
    por que o final do capitolo diz que quando a noite chegase era hora de tirar a prova e eu acho que isso é uma ameaça para Melanie.

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  7. Quando sai o proximo post? Amei demais

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